Partilhar conhecimento para melhor cuidar dos doentes oncológicos

Por Eduarda Reis, Presidente do Conselho Médico da Lusíadas Saúde e membro da Comissão Organizadora do Lusíadas Oncology Summit 2023.


No passado, um diagnóstico de cancro era sinónimo de um prognóstico muito reservado. A doença oncológica era, em muitos casos, um foco de desesperança, sem tratamento possível e de rápida evolução. Felizmente, este retrato alterou-se substancialmente nas últimas décadas, com a criação de programas de rastreio e uma evolução gigantesca no desenvolvimento de novas terapêuticas e métodos de diagnóstico mais modernos que permitem que os doentes sejam tratados (e em alguns casos até curados) sem o recurso à cirurgia ou com cirurgias mais conservadoras.

Hoje, a doença oncológica é cada vez mais uma doença crónica. O tempo de sobrevida aumentou consideravelmente e a qualidade de vida dos doentes oncológicos registou melhorias extraordinárias.

Hoje, somos capazes de detetar algumas neoplasias mais precocemente, temos equipamentos e meios de diagnósticos mais avançados e menos lesivos, contamos com uma multiplicidade de alternativas de tratamento – desde a quimioterapia, a radioterapia ou a inovadora imunoterapia, – desenhamos planos de tratamento cada vez personalizados às necessidades de cada doente.

Em suma, sabemos hoje mais sobre a doença oncológica e o seu impacto do que no passado. Mas, sobretudo, percebemos que o trunfo do sucesso no combate ao cancro assenta no contributo dos vários profissionais de saúde: desde a funcionária administrativa que faz o registo dos doentes, passando pelos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, aos enfermeiros que acompanham o doente ao longo da sua jornada, até aos médicos de diversas especialidades. Nesta equação, assistimos à crescente participação de um conjunto de novos atores neste processo – engenheiros e especialistas em tecnologias disruptivas, como a inteligência artificial, a robótica, a realidade virtual ou a realidade aumentada – que estão a abrir portas da inovação no rastreio, diagnóstico e no tratamento do cancro.

É exatamente com o intuito de partilhar este conhecimento inovador e multidisciplinar que o grupo Lusíadas, através da Lusíadas Knowledge Center, realizou a 2a edição do Lusíadas Oncology Summit. Durante dois dias, os participantes tiveram acesso a informação científica atual e de elevada qualidade que esperamos que seja útil para capacitar os profissionais de saúde a tratarem melhor os seus doentes.

Porque esse é o nosso compromisso: saber cuidar.

O cancro em Portugal: uma breve síntese

Apesar dos avanços da medicina e da crescente aposta na prevenção e no rastreio precoce, o cancro continua a ser a segunda principal causa de morte em Portugal – logo a seguir às doenças do aparelho circulatório. De acordo com os dados do INE, relativos a 2021, os tumores malignos foram a causa de óbito de 27.644 pessoas em Portugal. Apesar dos números terem descido ligeiramente (-2,6%) face ao ano anterior, o cancro foi responsável por mais de 22% dos óbitos registados nesse ano. Esta mortalidade foi atribuída, sobretudo, ao cancro do pulmão e ao cancro colorretal.

A pandemia trouxe uma pressão acrescida sobre este tema: com os holofotes e as preocupações centradas no combate à Covid-19, o cancro, juntamente com outras patologias, foi colocado para segundo plano, refletindo-se num número menor de consultas e exames de diagnóstico realizados. Ao mesmo tempo, a adesão aos programas de rastreio atualmente em vigor – para o cancro da mama, o cancro de colo do útero e o cancro colorretal – também diminuiu.

Nas próximas décadas, a pressão da doença oncológica sobre os sistemas de saúde, em Portugal e no mundo, não deverá abrandar. Segundo as estimativas da International Agency For Research on Cancer (IARC), em 2040 haverá em Portugal 70,7 mil novos casos de cancro diagnosticados – um indicador que representa uma subida de 16,8% face ao número estimado de novos casos diagnosticados em 2020.

Mas nem tudo são más notícias. O recente relatório da OCDE sobre o “Perfil sobre Cancro por País – Portugal 2023”, realizado no âmbito do Registo Europeu das Desigualdades no Domínio do Cancro, mostra que a incidência do cancro em Portugal é uma das mais baixas na União Europeia (UE), ao passo que as taxas de sobrevivência (a cinco anos) nas neoplasias mais comuns – cancro da próstata, da mama, do colo do útero, do pulmão e a leucemia infantil – são superiores em Portugal face à média da UE. “Tal está associado à melhoria da qualidade dos cuidados oncológicos, nomeadamente, em termos de deteção precoce e de acesso a tratamentos inovadores”, explica aquele organismo.

Há, no entanto, um longo caminho a percorrer. Segundo a OCDE, é necessário melhorar os indicadores da mortalidade de cancro, trabalhar na prevenção e debelar as desigualdades no acesso ao diagnóstico precoce e bem como aos cuidados de saúde de qualidade.

A inovação no tratamento da doença oncológica: do rastreio ao follow up

É um facto: nas próximas décadas, vamos continuar a assistir ao aumento de novos casos de cancro diagnosticados. Perante esta evidência, o que podem os sistemas de saúde públicos e privados fazer para cuidar melhor dos doentes oncológicos, detetar mais precocemente a sua doença e tratar as pessoas com maior eficácia de forma a proporcionar o aumento da sua expectativa e qualidade de vida?

Foi exatamente com o intuito de dar uma resposta aos desafios atuais que a medicina oncológica enfrenta que a Lusíadas Knowledge Center organizou, nos dias 22 e 23 de junho, o Lusíadas Oncology Summit 2023. O objetivo deste encontro foi reunir no mesmo espaço médicos de diversas especialidades, enfermeiros, gestores em saúde, a indústria farmacêutica, técnicos de diagnóstico e outros profissionais do setor de saúde, para partilhar conhecimento científico sobre as melhores e mais inovadoras abordagens terapêuticas no tratamento e acompanhamento do doente oncológico ao longo de toda a sua jornada.

 

Equidade no acesso à inovação e a sustentabilidade financeira das novas terapias: Os grandes desafios
A inovação foi o mote para a sessão de arranque do Lusíadas Oncology Summit 2023, subordinada ao tema “A Gestão da Inovação”. Ricardo Encarnação, diretor médico da Roche em Portugal, acredita que a inovação e a transformação digital no tratamento da doença oncológica passarão por várias frentes. Por um lado, a medicina oncológica será cada vez mais personalizada e de precisão. “Temos de encontrar o medicamento certo, para o doente certo, no momento certo”, explica. Ao mesmo tempo, as terapias digitais e a monitorização remota dos doentes serão uma realidade cada vez mais comum. O mesmo acontece com a utilização crescente dos dados de vida real – um ponto absolutamente crítico para conseguirmos evoluir.

Contudo, toda esta inovação traz também desafios: “Não tenhamos ilusões: aumentar o número de medicamentos e de soluções diagnósticas não serve de muito se não conseguirmos desbloquear o sistema e garantir que ele se torne sustentável. Caso contrário, teremos sempre uma enorme dificuldade em fazer chegar a inovação aos doentes na altura certa”, alertou o especialista. Uma opinião consensual e unânime entre os profissionais presentes. “Uma das prioridades é garantir a equidade do acesso às novas tecnologias e à inovação, mas é também importante e prioritário manter a sustentabilidade económica e financeira do sistema”, salientou Eduarda Reis, Presidente do Conselho Médico da Lusíadas Saúde.

Apesar da dimensão e das dificuldades que este desafio apresenta, um ponto é certo: “não podemos abdicar da inovação, por isso temos de encontrar novas soluções para que a inovação seja mais fácil de implementar”, sublinhou Sérgio Barroso, coordenador do Centro de Oncologia do Hospital Lusíadas Amadora e membro da Comissão Organizadora do Lusíadas Oncology Summit 2023.

Mas como conseguir concretizar este objetivo? O especialista acredita que uma das vias possíveis, no campo da investigação e desenvolvimento, passará por uma alteração da metodologia de I&D e dos ensaios clínicos para que possa ser “mais rápida, mais facilmente transportada para os doentes e possa ser mais facilmente financiada”.

Mas há mais caminhos que se perfilam no horizonte para assegurar a sustentabilidade financeira da inovação. Num contexto em que as terapias desenvolvidas para o cancro são cada vez mais disruptivas, mais efetivas, mas também mais onerosas, Óscar Gaspar, presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP) acredita que o futuro da Oncologia Médica moderna passará, não tanto pelo foco no “doente agudo, mas sim na adoção de uma visão de ciclo de vida, apostando mais na prevenção e nos rastreios”.

 

◦ A inovação não é sempre sinónimo de disrupção
Um outro aspeto que sobressaiu da 2a edição do Lusíadas Oncology Summit é que a inovação, nem sempre tem de representar investimentos avultados ou espelhar-se no desenvolvimento de novos medicamentos. “A inovação não tem de ser disruptiva. Por vezes, são pequenas medidas que implementamos em determinados pontos da jornada e que fazem a diferença”, avançou Sérgio Barroso.

Na verdade, ao longo dos dois dias do evento foram dados vários exemplos de iniciativas inovadoras, mas de simples implementação, que têm um efeito potencial positivo multiplicador na prevenção, no diagnóstico ou mesmo no seguimento dos doentes oncológicos. Óscar Gaspar mencionou o exemplo das escolas nos Países Baixos que estão a transformar os dispensadores de álcool gel usados durante a pandemia para serem utilizados como embalagens de protetor solar, ajudando assim a prevenir o cancro da pele junto das crianças e jovens.

Por seu lado, Catarina Sousa, cardiologista na Clínica Lusíadas Oriente e coordenadora da investigação da Lusíadas Knowledge Center, sugeriu que a criação de um simples cartão oncológico poderia ser um verdadeiro game changer na melhoria do seguimento e do follow up dos doentes oncológicos. Este documento funcionaria como uma espécie de “Bilhete de Identidade Oncológico”, contendo a informação fundamental sobre os tratamentos e as doses a que o paciente foi sujeito e que poderia ser utilizado sempre que o doente entrasse em contacto com os serviços de saúde.

Mas os exemplos de inovação continuam. Na sessão subordinada ao tema da Trombose Associada ao Cancro (CAT)”, Joana Augusto, especialista em Oncologia Médica no Hospital Lusíadas Amadora, apresentou um novo protocolo que o grupo Lusíadas pretende implementar ao longo deste ano para ajudar a prevenir o risco de CAT. Recorde-se que os tromboembolismos venosos são a complicação mais frequente nos doentes oncológicos e a segunda causa de morte nos doentes oncológicos. “O conceito desta CAT Clinic é fornecer, no local, a avaliação do risco e o tratamento farmacológico para a trombose associada ao cancro e, desta forma, aumentar o cumprimento das recomendações nacionais e internacionais para a prevenção da CAT”.

 

◦ Os tratamentos de última geração no combate ao cancro
Não é possível falar de soluções inovadoras na Oncologia Médica sem mencionar as novas terapias e os tratamentos de última geração que estão neste momento a ser utilizados (ou estudados) tanto no tratamento dos cancros com maior incidência, como nas neoplasias com níveis de mortalidade mais elevados.

Na área da Hematologia, por exemplo, foi destacado o papel revolucionário da terapia genética que utiliza as células CAR-T no tratamento do cancro do sangue, onde se destacam os linfomas e leucemias.

Também no tratamento do cancro da próstata registam-se avanços nesta dimensão, com a implementação da terapia com radioligantes nos casos de tumores da próstata metastáticos e resistentes à castração. Miguel Barbosa, coordenador do Centro de Oncologia do Hospital Lusíadas Porto e membro da Comissão Organizadora do Lusíadas Oncology Summit, lembrou que “o cancro da próstata é o terceiro cancro mais frequente no nosso país, afetando perto de 7.000 homens todos os anos, sendo que 2.000 homens morrem desta doença”. E dada a sua prevalência, é fundamental saber tratá-la e estarmos atentos ao impacto das novas terapêuticas que vão surgindo – como o Lutécio-177-PSMA-617.

 

De seguida, destacamos alguns dos elementos mais inovadores em três tipologias de cancro:

◦ Cancro da mama
O cancro da mama é, de acordo com os dados do Globocan 2020, um dos mais comuns em Portugal e o mais prevalente nas
mulheres. É também a quinta neoplasia com maior peso na mortalidade por cancro no nosso país. Os dados espelham a relevância deste tema e justificam o facto de o cancro da mama ter sido abordado em quatro painéis distintos na 2a edição do Lusíadas Oncology Summit.

Numa das sessões, o tema foi abordado numa perspetiva das decisões pós-tratamento neoadjuvante. Paulo Cortes, coordenador do Centro de Oncologia do Hospital Lusíadas Lisboa e membro da Comissão Organizadora do Lusíadas Oncology Summit, explicou a relevância deste tema. “Com a terapêutica neoadjuvante estamos não só a fazer um downstaging mas também a tratar mais precocemente a doença. E isso pode ter um impacto importante na definição das terapêuticas seguintes, após a intervenção cirúrgica”. O especialista lembrou ainda que, cada vez, mais “abordamos os doentes com cancro da mama em fase precoce com terapêuticas e contextos de tratamento neoadjuvante”.

Por seu lado, num outro painel, o foco da discussão entre os especialistas assentou nos avanços registados no cancro na mama RH+,HER2-. Joana Reis, oncologista no Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), apresentou alguns estudos sobre terapêuticas que podem constituir uma esperança para estes doentes – entre eles, um estudo de vida real com a utilização de abemaciclib adjuvante realizado em oito doentes com cancro da mama RH+ HER2-, no CHUSJ. No âmbito do mesmo painel, a oncologista do Hospital Lusíadas Amadora, Joana Augusto, apresentou dois casos clínicos no contexto de cancro da mama luminal HER2- avançado.

Por outro lado, Gabriela Sousa, diretora do serviço de Oncologia Médica do Instituto Português de Oncologia do Porto, e Sandra Bento, diretora do serviço de Oncologia Médica do Hospital de Santarém, trouxeram para cima da mesa, numa outra sessão, um tema cada vez mais atual: a importância de colocarmos em prática diagnósticos genéticos precoces para prevenir o desenvolvimento do cancro hereditário da mama (e também do ovário) nas situações em que é identificado um défice de recombinação homóloga, mas também para tratar o cancro da mama de forma mais eficaz.

O assunto reveste-se de maior importância uma vez que os inibidores de PARP aprovados para serem implementados no âmbito do cancro da mama metastizado só podem ser utilizados em mulheres que apresentem alterações genéticas nos genes BRCA1 e BRCA2. Deste modo, torna-se evidente que a genética assume papel cada vez mais decisivo na prevenção e tratamento da doença oncológica.

Os avanços terapêuticos implementados no combate ao cancro da mama foram ainda debatidos numa outra sessão intitulada: “Do cancro da mama ao gástrico: avanços terapêuticos na doença HER 2 positiva”. Estes progressos são, na visão de Paulo Cortes, um dos moderadores deste painel, um reflexo de como “a oncologia moderna é cada vez mais precisa”. E existe uma preocupação “em dar os tratamentos mais eficazes e ao mesmo tempo menos tóxicos, diminuindo a intensidade dos tratamentos, quer sejam radioterapia, quimioterapia ou cirurgia”.

 

◦ Cancro do pulmão
As estatísticas mostram que o cancro no pulmão não só é um dos mais frequentes, mas é aquele que causa a maior mortalidade por cancro em Portugal. Para inverter esse cenário, é crítico haver uma maior aposta na prevenção (sobretudo na luta contra o tabagismo) e implementar um programa de rastreio nacional para este tipo de cancro.

Susana Moreira, pneumologista no Hospital Lusíadas Lisboa, explicou durante o Lusíadas Oncology Summit 2023 os principais entraves que explicam a falta de consenso europeu sobre o desenvolvimento de um modelo de rastreio eficaz e focou a importância da tecnologia para fazermos no futuro próximo diagnósticos mais eficazes. “A tecnologia vai ser um ponto de viragem. Por um lado, a inteligência artificial vai ajudar a agilizar a identificação dos nódulos, nomeadamente os nódulos de pequena dimensão e que são de difícil identificação. Por isso, se o equipamento fizer este trabalho e depois o radiologista validar a informação, conseguimos encurtar o tempo e acelerar o tratamento”. A especialista lembra ainda que os algoritmos [usados como tabelas de risco] vão permitir reduzir a população que vai ser rastreada e espaçar o tempo do rastreio.

A incorporação de algumas destas tecnologias não é novidade para Natalie Antunes, médica imagiologista do Hospital de Cascais e que neste momento realiza também rastreios do cancro do pulmão, no Reino Unido. A especialista utiliza um software específico para ajudar a detetar nódulos e a caracterizá-los em termos de volume e diâmetro. “Funciona como um segundo leitor, nunca um primeiro leitor. Não é o software que vai tomar uma decisão final, até porque nem sempre concordamos com ele. Contudo, é uma ferramenta muito eficaz na deteção dos nódulos e, se a volumetria for correta, é um instrumento ótimo para o follow up”. Natalie destaca ainda o facto dos novos equipamentos TAC estarem cada vez mais eficientes “na produção de melhores imagens, com menor radiação”.

 

◦ Cancro colorretal
No ranking das neoplasias mais prevalentes, o cancro colorretal aparece como o segundo tipo de cancro que gera um número mais elevado de óbitos. Para estancar estes dados, o caminho passa não só pela prevenção, mas também na otimização e personalização do tratamento dos doentes do cancro colorretal. A tecnologia, nomeadamente a robótica e a realidade aumentada, assume aqui um papel de destaque.

Nuno Figueiredo, coordenador da Unidade de Cirurgia Geral do Hospital Lusíadas Lisboa, explicou como utiliza a cirurgia robótica na remoção do cancro colorretal para obter um ato cirúrgico “mais preciso, menos invasivo, retirando a lesão, causando o mínimo de danos possível a nível urinário, sexual e até mesmo funcional”. E adianta: “Conseguimos ser mais finos no gesto. Além disso, como o robot tem câmaras e dispositivos que nos permitem ver para além daquilo que é o espectro da visão humana, conseguimos obter uma visão tridimensional imersiva. Ou seja, os cirurgiões quando estão a operar estão a executar um procedimento como se estivessem no interior do organismo”, explica.

A importância da multidisciplinaridade

A Oncologia não é uma especialidade per si, pelo que o tema da multidisciplinaridade sempre foi um aspeto fundamental na prevenção, no tratamento e no acompanhamento da doença oncológica.

Ao longo dos dois dias do Lusíadas Oncology Summit foi sublinhada a ideia de que este é um tema que necessita de ser analisado com diferentes lentes para se obter uma fotografia completa e real da situação do paciente. Só assim, com esta visão holística e com o contributo dos diversos profissionais é possível alcançar bons resultados. Sérgio Barroso explica porquê: “A Oncologia é uma área em que não podemos olhar apenas para a doença. É fundamental analisarmos todo o contexto que envolve o doente para conseguirmos formular uma boa estratégia de diagnóstico, de tratamento e de seguimento”. E isso só é possível com o contributo da visão e do conhecimento especializado de um conjunto alargado de profissionais de saúde.

Uma opinião corroborada e justificada por Paulo Cortes: “As equipas Interdisciplinares contam, nomeadamente, com nutricionistas e psicólogos, para além das várias especialidades médicas dedicadas ao diagnóstico e tratamento do doente oncológico”.

No futuro, deveremos continuar a assistir a um aprofundamento e alargamento desta multidisciplinaridade. “Primeiro alargámos a multidisciplinaridade no tratamento da doença oncológica a várias áreas médicas. Numa fase posterior, alargou-se o conceito à enfermagem e aos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica. E agora estamos a assistir ao contributo dos profissionais que trabalham com os sistemas de informação e com a inteligência artificial – muitos deles estão fora do setor da saúde – e trazem os seus inputs para esta área”, sublinha a Presidente do Conselho Médico da Lusíadas Saúde, Eduarda Reis.

Por estes motivos, a segunda edição do Lusíadas Oncology Summit deu voz não só aos médicos e investigadores, mas também aos técnicos de diagnóstico e terapêutica e aos enfermeiros pelo papel fundamental que desempenham no acompanhamento da jornada do doente oncológico.

No caso da sessão dedicada aos técnicos de diagnóstico, os participantes tiveram oportunidade de perceber melhor qual o papel da imagiologia no percurso do doente oncológico e saber mais sobre a importância da consulta com um radioncologista antes do início de tratamento com radioterapia. Susana Graça, do Hospital Lusíadas Amadora, sublinhou o papel crítico dos técnicos neste processo: “Somos nós, numa primeira abordagem, que descobrimos um problema oncológico. É muito importante sinalizar estes casos e rapidamente encaminhar os doentes para o caminho certo, de forma a evitar o descalabro da doença”.

Mas além dos conhecimentos técnicos, é também fundamental que estes profissionais de saúde estejam também dotados de competências humanas, de gestão e de comunicação para conseguirem apoiar da melhor forma possível os doentes oncológicos. Isso mesmo ficou evidente nas duas sessões de enfermagem – uma dedicada ao tema da morte e da comunicação das más notícias e outra focada na navegação dos doentes oncológicos em consulta de enfermagem. Nesse sentido, Raquel Flores, do Hospital Egas Moniz, deu a conhecer um protocolo, baseado em seis passos, com estratégias práticas para ajudar os enfermeiros a saberem como comunicar más notícias aos pacientes oncológicos e as suas famílias. Por sua vez, Nádia Neto Henriques, do Hospital Lusíadas Lisboa, vincou a importância da consulta de enfermagem no acompanhamento do doente ao longo da sua jornada.

O crescente empoderamento dos doentes

Um outro denominador comum às diversas intervenções do Lusíadas Oncology Summit 2023 foi a preocupação centrada no doente e o papel cada vez mais ativo e participativo que o paciente oncológico tem ao longo de todo o processo.

Esta tendência deverá ser reforçada no futuro com um maior empoderamento do doente. A ideia subjacente a este princípio é de que os doentes (bem como as suas famílias e os seus cuidadores) deverão estar envolvidos em todas as fases do processo e estar mais informados e preparados para tomar decisões responsáveis, baseadas em conhecimento. Desta forma, o doente estará capacitado para ter uma postura mais ativa e colaborativa, contribuindo para um resultado mais eficaz e bem-sucedido da sua jornada.

“Todos reconhecemos que os doentes informados têm melhores resultados em saúde. A aposta na literacia em saúde é um aspeto crítico, especialmente, num contexto em que a saúde se transforma a um ritmo cada vez mais acelerado e, como tal, o esforço de atualização é cada vez maior e mais difícil”, sublinhou Ricardo Encarnação da Roche.

Conclusões

A inovação está presente em todas etapas da jornada do doente oncológico. Graças à inovação temos atualmente equipamentos de diagnóstico de última geração que permitem detetar e caracterizar nódulos suspeitos com maior rigor e precisão (usando para esse efeito uma menor radiação). Já no campo do tratamento assistimos ao surgimento de medicamentos e de terapêuticas cada vez mais inovadoras, permitindo que os doentes sejam tratados ou mesmo curados. Por outro lado, a adoção de tecnologias como a realidade aumentada e a robótica estão a contribuir para aumentar a precisão no ato cirúrgico de remoção de um tumor. E, cada vez mais, os algoritmos de machine learning e de inteligência artificial serão armas de combate ao cancro.

Mas para que todo este novo conhecimento científico chegue ao maior número possível de doentes oncológicos é fundamental trabalharmos para encontrar soluções que permitam tornar a inovação no cancro mais acessível e mais sustentável do ponto de vista financeiro.

A 2ª edição do Lusíadas Oncology Summit serviu para partilhar conhecimento científico sobre os temas oncológicos mais dominantes, cimentar a importância da visão holística e multidisciplinar no tratamento do cancro e também para discutir possíveis soluções para dar resposta aos principais desafios que se perfilam a curto/médio prazo na medicina oncológica.

Com esta iniciativa, o grupo Lusíadas Saúde reforça o seu compromisso de cuidar, em todas as suas dimensões, contribuindo para que os doentes oncológicos possam viver por mais tempo, com menos complicações e com uma melhor qualidade de vida.