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Prevenir a depressão

A depressão atinge cerca de 20% da população portuguesa mas ainda é negligenciada pelos doentes e, por vezes, incompreendida pela família e amigos. Com a ajuda de três especialistas, fique a saber como se caracteriza e como pode prevenir a depressão nas várias fases da vida.

Identificar os primeiros sinais de alarme é o primeiro passo para prevenir a depressão ou evitar a progressão da doença, afirma Ana Peixinho, coordenadora da Unidade de Psiquiatria e Psicologia do Hospital Lusíadas Lisboa.

Sinais a vigiar para prevenir a depressão

  • Tristeza;
  • Diminuição do interesse e do prazer nas atividades habituais;
  • Alterações do apetite e sono;
  • Agitação ou lentificação física e psíquica;
  • Fadiga ou diminuição da energia;
  • Perda da autoestima/confiança ou sentimentos de culpa;
  • Diminuição da concentração ou da capacidade de tomar decisões;
  • Ideias recorrentes de morte e/ou de suicídio;
  • Comportamentos suicidários.

Será depressão? O impacto no dia a dia

Considera-se que é recomendável procurar ajuda especializada de um médico quando:

  • Os sintomas têm a duração de, pelo menos, duas semanas;
  • Ocorrem na maioria dos dias;
  • Provocam sofrimento significativo;
  • Têm implicação negativa no desempenho social, ocupacional ou noutras áreas do funcionamento pessoal.

A doença é tanto mais incapacitante quanto mais grave for a depressão, classificada pela psiquiatria como “leve, moderada ou grave”. Segundo Ana Peixinho, “a perigosidade da depressão associa-se à incapacidade e limitações pessoais/sociais e profissionais que desencadeia e, no limite, ao risco de suicídio”.

Depressão nas várias fases da vida

1. Na adolescência

Com uma incidência de 15-20%, sendo duas vezes mais frequente no sexo feminino, a depressão na adolescência corresponde “a um período de transição, em que se faz o luto da infância e se colocam à prova as capacidades do jovem para lidar com as mudanças e desafios do crescimento. O adolescente procura a autonomia, mas também a teme. Este conflito é, muitas vezes, gerador de estados depressivos”, explica a pedopsiquiatra Áurea de Ataíde com consultório privado no Hospital Lusíadas Lisboa.

A especialista lembra que “os conflitos frequentes com as figuras parentais, bem como a necessidade de integração no grupo de pares e as inseguranças associadas, deixam no adolescente uma marca de solidão e incompreensão por vezes difíceis de ultrapassar”. As alterações hormonais e os diferentes processos psicológicos que estão em curso neste período respondem “a muitos quadros depressivos na adolescência”.

A pedopsiquiatra revela ainda que as raízes da depressão na idade adulta estarão na adolescência e os motivos são naturalmente heterogéneos: “Existem fatores de risco individuais, como o temperamento, a capacidade para lidar com o stresse ou situações de conflito, e fatores familiares ou do meio, nomeadamente história familiar (genética) ou disfunção familiar, história prévia de outras perturbações, como hiperatividade, ansiedade, entre outras.

Também as dificuldades de aprendizagem, como é o caso do insucesso escolar ou dificuldades na socialização com os pares, como é exemplo o bullying, são igualmente fatores de risco, assim como episódios traumáticos (maus-tratos, abuso, luto, perdas). Existem ainda fatores de stresse psicossocial e a doença crónica.”

Diagnóstico precoce é essencial

A médica adverte para “a necessidade de um diagnóstico preciso e precoce”. E justifica: “A depressão na infância e adolescência é muitas vezes subdiagnosticada e mascarada, sendo essencial fazer o seu diagnóstico diferencial. A intervenção terapêutica dependerá da gravidade da depressão e do risco de suicídio, muito frequente na depressão do adolescente. Se este risco é muito elevado, pode ser necessário o internamento.

A sensibilização da família, aliada à compreensão e aceitação da situação são essenciais. A abordagem terapêutica mais eficaz implica a associação de medicação à psicoterapia, nomeadamente cognitivo-comportamental, sem esquecer o estabelecimento de uma relação terapêutica empática e de confiança.” 

2. No adulto

Os motivos para a depressão são multifatoriais, oscilam em função da idade e podem ser bastante complexos. Como explica a coordenadora da Unidade de Psiquiatria e Psicologia do Hospital Lusíadas Lisboa, “a doença surge de uma conjugação de fatores que englobam a vulnerabilidade genética, as características da personalidade, as vivências na infância, o ambiente social, as características psicológicas e os próprios fatores biológicos que envolvem alterações na atividade neuronal e no eixo hipotálamo-hipofisário que modificam a atividade dos circuitos neuronais responsáveis pela regulação do humor.”

Nos adultos, a depressão pode ocorrer “por volta dos 27 anos, sendo que a depressão grave é mais prevalente na faixa etária dos 18 aos 44 anos”, aponta Ana Peixinho.

  • Tratamentos disponíveis

Os tratamentos mais aconselhados são farmacológicos, nomeadamente os antidepressivos, e psicológicos. “Atualmente, utiliza-se com maior frequência uma classe específica de antidepressivos chamada de Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina, por serem eficazes, seguros e com poucos efeitos adversos.

A abordagem psicológica depende do próprio doente e inclui terapia de suporte, cognitivo-comportamental, interpessoal, familiar ou psicodinâmica”, explica. 

3. No pós-parto

Consequência de profundas alterações hormonais que, ligadas à fadiga se tornam uma mistura explosiva, a depressão perinatal surge na gravidez, parto ou período pós-parto.

Ocorre em cerca de 11% das mulheres durante a gravidez e em 13%, no primeiro trimestre pós-parto. Ana Peixinho, também responsável pela Consulta de Psiquiatria Perinatal, esclarece que “os sintomas são semelhantes aos da depressão noutras fases da vida e igualmente incapacitantes e perigosos”.

Cinquenta por cento das mulheres no período pós-parto são afetadas pelo chamado baby blues: os sintomas “surgem nos primeiros três dias após o parto e terminam entre o 7º e o 10º dia. Verifica-se um pico de intensidade ao 5º dia. Incluem choro fácil, irritabilidade, tristeza, ansiedade e alterações do sono e do apetite. Esta situação tem intensidade moderada. É importante realçar que a ocorrência de baby blues está associada ao desenvolvimento posterior de depressão pós-parto.”

  • Tratamentos da depressão perinatal

É prioritário, reforça, “estar atenta para a depressão no contexto da gravidez e não exclusivamente no período pós-parto”. A médica considera que “um adequado acompanhamento psicossocial durante a gestação, realizado pelo médico assistente e por um técnico de referência, como o enfermeiro, criam uma rede de apoio e suporte à grávida que a tranquiliza”.

Sabe-se que 3% das mulheres grávidas estão medicadas com antidepressivos na Europa e 10% nos EUA. 

4. Na terceira idade

Ricardo Coentre, responsável pelas consultas de Psiquiatria Geriátrica no Hospital Lusíadas Lisboa, sublinha que “a depressão não é uma consequência normal do envelhecimento”.

Entre os principais fatores de risco para desenvolver a doença nesta idade encontra-se o ser de “sexo feminino, o isolamento social, a viuvez, o divórcio ou a separação, bem como o baixo nível socioeconómico, a existência de outras doenças médicas, insónia e alterações cognitivas.”

  • Prevenir e tratamentos disponíveis

O médico refere que não existem estudos significativos na prevenção da depressão no idoso: “Podemos dizer que a eliminação de alguns fatores de risco referidos, como por exemplo tratamento adequado das outras doenças médicas e da dor, poderão reduzir o risco para a depressão no idoso. Também a vida ativa – com atividade física e mental – é positiva neste escalão etário. O mais importante será o diagnóstico e o tratamento adequado da depressão nos idosos.”

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