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Congelamento ou Criopreservação de Óvulos: Quando pode fazer sentido?

Colaboração
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Nos últimos anos, tem-se verificado um aumento significativo do número de mulheres a optarem por adiar a maternidade, seja por razões profissionais, pessoais ou financeiras. Paralelamente, cresceu também o recurso ao congelamento ou criopreservação de ovócitos por opção da mulher, uma prática que permite preservar o potencial reprodutivo e aumentar as hipóteses de engravidar no futuro.

Segundo dados recentes, nos últimos anos tem-se verificado um aumento no número de mulheres saudáveis que recorreram a esta técnica em Portugal, o que reflete uma mudança cultural e social profunda na forma como se encara a maternidade.

O que é o congelamento de óvulos e para que serve?

O congelamento de óvulos, também conhecido como criopreservação de ovócitos, é uma técnica utilizada para preservar os óvulos de uma mulher para uso futuro. A sua principal função é manter a qualidade dos ovócitos, que naturalmente diminui com a idade, mesmo em mulheres saudáveis.

Esta técnica é especialmente relevante, pois é frequente que, a partir dos 35 anos, a fertilidade feminina comece a diminuir. Com o avançar da idade, a quantidade e a qualidade dos óvulos reduzem progressivamente, tornando mais difícil a conceção, quer de modo natural, quer através do uso de técnicas de Procriação Medicamente Assistida (PMA).

Com o aumento da idade, acumulam-se erros cromossómicos nos ovócitos, que geram alterações nas fertilizações, o que inviabiliza a evolução da gravidez e explica a menor fertilidade das mulheres, principalmente depois dos 40 anos.

Como é feita a recolha e preservação dos óvulos?

O processo envolve várias etapas, realizadas com acompanhamento médico em clínicas especializadas, sendo as principais fases:

  • A estimulação ovárica (cada vez mais patient friendly), onde a mulher toma medicação hormonal, usualmente muito bem tolerada, durante cerca de 10 a 14 dias para estimular os ovários a produzir o crescimento sincronizado de múltiplos folículos (em vez de apenas um por ciclo).
  • A monitorização por ecografia e análises hormonais, para acompanhar a resposta ao tratamento.
  • A punção ovárica, que consiste na recolha dos ovócitos por aspiração transvaginal, realizada sob sedação, através de uma agulha guiada por ecografia.
  • A criopreservação dos ovócitos maduros a temperaturas muito baixas por vitrificação, o que permite conservar a sua viabilidade durante vários anos.

Em Portugal, os ovócitos ficam congelados por um período de cinco anos, com possibilidade de renovação.

Existe um número ideal de óvulos a criopreservar?

O número ideal de ovócitos a congelar depende da idade da mulher, da sua reserva ovárica e do número de filhos que deseja ter no futuro. Em alguns casos, podem ser necessárias várias colheitas para alcançar esse objetivo. Contudo, este processo não compromete a reserva ovárica, uma vez que os ovócitos recolhidos seriam naturalmente utilizados pelo organismo, e não tem qualquer impacto na fertilidade futura. 

Quando é aconselhado e até que idade?

O congelamento de óvulos pode ser realizado em dois contextos:
 

Por razões médicas
Pode ser aconselhado a mulheres que vão iniciar tratamentos oncológicos (quimioterapia ou radioterapia), em casos de doenças autoimunes ou quando há necessidade de intervenções cirúrgicas com risco para a reserva ovárica. Nesta última incluem-se casos de endometriose grave, em que exista envolvimento dos ovários.

Por escolha pessoal
Cada vez mais mulheres entre os 30 e os 38 anos optam por congelar óvulos eletivamente, como forma de preservar a fertilidade. Idealmente, o procedimento deve ser feito até aos 35-36 anos, quando os óvulos ainda têm maior qualidade, embora seja possível realizá-lo mais tarde, mediante avaliação clínica e com o conhecimento de que, após os 40 anos, o sucesso na obtenção de gravidez posterior é mais baixo.

Como engravidar após o descongelamento?

Quando a mulher decide engravidar, os ovócitos previamente criopreservados são descongelados em laboratório, fertilizados com espermatozoides (através de fertilização in vitro e Microinjeção intracitoplasmática (ICSI)). Dos embriões resultantes um é transferido para o útero, podendo os restantes, caso tenham qualidade, ser congelados.

O sucesso da gravidez vai depender de vários fatores:

  • Idade da mulher no momento da recolha dos ovócitos;
  • Número de ovócitos criopreservados;
  • Qualidade dos ovócitos e dos embriões formados;
  • Saúde geral da mulher e do parceiro (qualidade dos espermatozoides).

Apesar de não garantir uma gravidez futura, esta técnica aumenta significativamente as hipóteses, especialmente quando comparada com a fertilidade natural após os 40 anos. O risco de alterações cromossómicas do feto, depende da idade da mulher na altura da colheita de ovócitos e não da idade em que a gravidez venha a ocorrer.

Em Portugal, só é possível a mulher vir a utilizar os seus ovócitos até ao dia em que faz 50 anos. 


Conclusão

A criopreservação de ovócitos oferece uma possibilidade de preservação do potencial reprodutivo, permitindo que as mulheres tenham maior autonomia no planeamento da maternidade. Com os avanços da medicina da reprodução e uma maior informação disponível, cada vez mais mulheres estão a recorrer a esta alternativa, com a consciência de que o tempo biológico não tem de ditar o tempo da maternidade. No entanto, devemos sempre relembrar que as gravidezes depois dos 40 anos se revestem de riscos obstétricos acrescidos, incentivando a escolha da ocorrência da gravidez mais cedo.
 

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Revisão Científica

Dr. Luís Vicente

Dr. Luís Vicente

Coordenador da Unidade de Procriação Medicamente Assistida

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