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Exame de eletromiografia: o que é e para que serve?

Colaboração
Divide-se em duas etapas e permite diagnosticar patologias dos músculos, da placa neuromuscular e dos nervos. 

O exame de eletroneuromiografia — mais conhecido por exame de eletromiografia — permite, através da análise da atividade elétrica dos músculos, diagnosticar doenças do músculo e da parte do sistema nervoso periférico que controla os músculos. 

“É realizado em casos de suspeita de problemas do sistema nervoso periférico, da placa neuromuscular ou do músculo”, explica Pedro Pereira, especialista em Neurologia, com subespecialização em Neurofisiologia Clínica, na Clínica Lusíadas Oriente.

Realizado em ambulatório por neurofisiologistas, o exame divide-se em duas etapas distintas: o primeiro momento é o estudo de condução nervosa, que permite avaliar a resposta muscular e dos nervos, diagnosticando potenciais patologias que possam existir nos nervos e placa neuromuscular, com recurso a elétrodos de estimulação e registo. E o segundo é o exame de eletromiografia, com recurso a elétrodos de agulhas “mais finas do que aquelas que são utilizadas para a colheita de sangue”. A realização das duas etapas nem sempre é necessária, dependendo da suspeita clínica e daquilo que o exame vai revelando.

A sensação de formigueiros, fraqueza ou alterações na sensibilidade e funcionamento dos músculos são as queixas que levam à realização do exame de eletromiografia, podendo representar manifestações de diferentes patologias.

Síndrome de canal cárpico

“A neuropatia mais frequente e o motivo número um para se pedir este exame é a síndrome canal cárpico, que é uma compressão do nervo mediano no punho. O exame consegue determinar se existe ou não lesão desse nervo”, explica. “As queixas mais características são formigueiros nas mãos.”

A síndrome de canal cárpico tem alguns fatores associados, havendo uma relação com a atividade laboral exercida, “particularmente em pessoas que têm de fazer movimentos repetidos com as mãos como, por exemplo, um cabeleireiro ou alguém que trabalhe num laboratório a fazer pipetagem”, exemplifica. 

Também incide mais em pessoas do sexo feminino, existindo um fator endócrino associado, sendo mais frequente durante a gravidez. “Nesse caso, pode ser um problema transitório e que se resolve no final da gravidez, sem que nada se faça.”

Mistenia gravis 

As patologias da placa neuromuscular habitualmente são de origem genética, infeciosa ou autoimune. A mais comum é a miastenia gravis: é caracterizada pela produção de anticorpos que, na maioria das casos, entram em conflito com os recetores da acetilcolina [neurotransmissor responsável pela contração muscular], fazendo com que a quantidade de acetilcolina que se liga aos recetores não seja suficiente para gerar a resposta do músculo.”

“Caracteristicamente, os indivíduos com miastenia gravis têm fraqueza muscular que é flutuante, havendo na maioria dos casos queixas oculares — as pálpebras começam a ficar mais baixas e não abrem tão facilmente ou os músculos que controlam os movimentos dos olhos ficam fracos, e com o desalinhamento ocular as pessoas começam a ver a dobrar”, explica. Por isso, uma das consequências comuns são as alterações na visão: “porque os músculos [dos olhos] são muito ativos. Nós passamos o dia de olhos abertos e, por isso, só durante a noite é que o levantador da pálpebra descansa.”

Por ser uma patologia autoimune, pode afetar qualquer músculo. E por estar relacionada com esta falha de comunicação com os músculos, pode manifestar-se de várias formas.” A miastenia gravis pode ter como sintoma ver a dobrar e ter a pálpebra mais descaída, como pode manifestar-se através de fraqueza respiratória, que gera a necessidade de internamento urgente por iminência de falência respiratória”, explica. 

Apesar de ser a patologia da placa neuromuscular mais comum, a miastenia gravis é “relativamente infrequente”. 

Doenças do músculo

“As doenças de músculo também são menos frequentes e podem ter várias etiologias como a genética, autoimune ou tóxica, devido à ingestão de alguns fármacos”, explica Pedro Pereira.

Existem “centenas, talvez milhares” de doenças genéticas do músculo. “Embora várias tenham características específicas, a maioria partilha sintomas em comum, nomeadamente a fraqueza proximal dos membros (elevar os braços, subir escadas).”

Mas existem algumas doenças genéticas que afetam predominantemente alguns grupos musculares específicos, como a face, os pés ou as mãos. Existe uma grande variedade, destacando-se as distrofias musculares, um conjunto de distúrbios que levam a perda progressiva de massa muscular e fraqueza.

Entre elas, as mais comuns são as distrofinopatias, nomeadamente a distrofia muscular de Duchenne e de Becker. “Afetam crianças e estão ligadas a uma má função do músculo, que vai progredindo ao longo dos primeiros anos de vida.”

Outros motivos

Existem outros motivos que podem encaminhar indivíduos para o exame de eletromiografia, como a polineuropatia, uma disfunção dos nervos, “comum nos doentes com diabetes” e que pode levar à perda de sensibilidade e de força nas mãos e ou nos pés. 

Depois, há ainda motivos relacionados com um possível trauma nos nervos periféricos, que gera uma perda de sensibilidade dos membros e/ou incapacidade no músculo, afetado a mobilidade. 

Como é feito o exame de eletromiografia

Realizado pelo neurofisiologista, e prescrito por um especialista em Medicina Geral e Familiar, Ortopedia, Neurologia, entre outros, o exame de eletromiografia é dinâmico, ou seja, vai-se adaptando à medida que fornece mais informação sobre a pessoa que está a ser examinada.

“Imaginemos que um indivíduo chega com suspeita de síndrome de canal cárpico, mas entretanto começa a fazer-se o exame e encontram-se disfunções noutros nervos ou estruturas que não justificam o quadro. Nesse caso, o exame tem de ser alargado e têm de ser avaliadas outras estruturas”, exemplifica Pedro Pereira. 

Apesar de ser denominado de exame de eletromiografia, nem sempre é necessário chegar a esta etapa. “Usa-se o termo de uma forma genérica para falar dos exames que se fazem num laboratório de eletromiografia. Mas habitualmente o exame é repartido em duas partes: o estudo de condução nervosa e a eletromiografia”, explica. “Em muitas situações nem é necessário fazer a parte de eletromiografia.”

No estudo de condução nervosa ou neurografia, colocam-se elétrodos para registar a resposta do músculo ou nervo ao estímulo elétrico. “Temos um estimulador elétrico, com dois elétrodos, através dos quais vamos aplicar pequenas correntes elétricas no nervo em estudo e depois outros dois elétrodos que vão captar a resposta do músculo ou nervo a esse estímulo.”

Com o estudo de condução nervosa é possível medir as respostas de amplitude e velocidade do músculo ou nervo à corrente elétrica. No exame de eletromiografia clássico é diferente: “Não se usam correntes elétricas, mas uma agulha — na maior parte dos laboratórios são agulhas concêntricas, com dois pequenos elétrodos dentro da mesma agulha.”

Coloca-se a agulha em músculos selecionados, analisando-se a atividade elétrica das fibras musculares próximas da agulha. “Permite observar a atividade elétrica do músculo em repouso e, depois, a atividade elétrica do músculo a contrair.”

Por ser dinâmico, “o tempo que o indivíduo passa na sala muda muito de pessoa para pessoa, podendo variar entre 10 minutos, 15 minutos ou 1 hora.”

O exame de eletromiografia causa dor?

“O estudo de condução nervosa é completamente inócuo. Não estão descritas complicações associadas. As correntes elétricas são mínimas e sem danos para os tecidos. Não obstante pode ocorrer algum desconforto durante o procedimento”, explica Pedro Pereira. 

“O eletromiograma é um exame com agulha e, portanto, pode causar uma sensação de incómodo nos músculos puncionados”, acrescenta. Esta sensação pode durar entre meia hora e uma hora, não sendo, no entanto, algo que condicione o resto do dia do indivíduo que foi puncionado. 

Contraindicações e cuidados

  • É importante manter uma rotina alimentar normal, sendo desaconselhado o jejum. O objetivo é que o indivíduo submetido ao exame esteja o mais relaxado e tranquilo possível. 
     
  • Não se devem aplicar cremes, loções e óleos no corpo, uma vez que estes, ao bloquearem o sinal, dificultam a aplicação dos estímulos elétricos, tornando o exame mais demorado e complicado. 
     
  • Antes de fazer o exame, é importante informar o médico sobre o tipo de medicação que se está a fazer, sobretudo no que diz respeito a anticoagulantes. “Apesar de não serem uma contraindicação absoluta, alguns músculos mais profundos e não tão facilmente compressíveis não deverão ser puncionados com agulha no exame, porque há a possibilidade de o paciente que toma anticoagulantes sangrar mais facilmente.”
     
  • É também importante informar sobre a presença de pacemaker ou cardiodesfibrilhadores implantáveis, pois nesse caso está contraindicada a estimulação em zonas mais próximas do pescoço ou axila.

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Dr. Pedro A. Pereira

Dr. Pedro A. Pereira

Clínica Lusíadas Oriente
Hospital Lusíadas Amadora

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